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Cardeal Scherer: Fake news que matam

Até onde podem levar as fake news! A mobilização da opinião pública a partir de narrativas falsas pode ter desdobramentos muito perigosos! Em outros tempos, com frequência, levavam ao linchamento físico. Hoje, é mais comum o linchamento moral.

(vaticannews.va/pt).-No tempo de Jesus não havia internet, mídias sociais, tablet ou celular. Mas já havia fake news. Não se chamavam assim: eram mentiras mesmo, calúnias, histórias maldosas inventadas para prejudicar alguém… E se espalhavam de boca em boca nas praças, no mercado, nas termas e nos encontros sociais. Sua difusão era mais lenta, mas, em compensação, não havia tanta facilidade, como hoje, para checar a veracidade das narrativas.

Dias atrás, escutei alguém afirmar que Jesus foi vítima de fake news. Será mesmo? No relato da Paixão de Cristo segundo Lucas, lido neste ano no Domingo de Ramos (cf. Lc 22,14-23,56), as graves acusações contra Jesus perante as autoridades romanas são claramente falsas. Diante de Pilatos, governador romano, os acusadores, determinados a conseguir a condenação de Jesus à morte, afirmam ser Ele um agitador do povo, que proíbe o pagamento do imposto a César. Tudo falso, sem nenhuma passagem do Evangelho que confirme essas acusações. Mas eram pesadas.

Bem sabiam os acusadores que os romanos não perdoavam os revoltosos e agitadores do povo, condenando-os à morte sem apelo. No entanto, nem Pilatos nem Herodes se deixam convencer por essas acusações contra Jesus. Pilatos declara de maneira inequívoca perante o povo que Jesus é inocente e que não encontra nele nenhum dos delitos dos quais Ele é acusado. Por três vezes, ele tenta soltar Jesus, mas os protestos e gritos da multidão se tornam cada vez mais fortes, pedindo a crucificação de Jesus.

Pilatos treme e vacila diante das ameaças de ser denunciado ao imperador romano por não agir com rigor contra um suposto rebelde e inimigo do imperador: “Se soltares a Jesus, não és amigo de César”. Lucas observa: “A gritaria deles prevaleceu”. Pilatos, então, lava as mãos, alegando não ter responsabilidades pela condenação de Jesus. Daí por diante, ninguém mais ousará defender Jesus, pois a narrativa acusatória de falso profeta, blasfemador, agitador do povo, inimigo público, elemento antissocial e perigoso para a nação está emplacada.

Até onde podem levar as fake news! A mobilização da opinião pública a partir de narrativas falsas pode ter desdobramentos muito perigosos! Em outros tempos, com frequência, levavam ao linchamento físico. Hoje, é mais comum o linchamento moral, igualmente doloroso, prejudicial e injusto. Como se explicará diante de Deus quem assim procede? Como se justificará diante de sua consciência quem condena uma pessoa, cedendo à pressão e ameaça, ou para levar alguma vantagem pessoal, mesmo sabendo que se trata de um inocente?

As fake news, que levaram à condenação de Jesus à morte, eram pretextos para o enquadrar em algum delito, que requeria a pena de morte. O verdadeiro motivo, porém, era religioso: Jesus afirmava que Deus era seu Pai, e que Ele agia em nome e com o poder de Deus. E que tinha autoridade para interpretar a religião de modo diverso daquele das autoridades religiosas do seu tempo. E confirmava sua fala com milagres estupendos, sinais de que Deus estava com Ele.

As narrativas acusatórias contra Jesus se desfazem já na sua morte sobre a cruz, e as fake news são reconhecidas por quem menos se esperava: o bom ladrão reconhece que Jesus é inocente e lhe pede que se lembre dele quando entrar no seu reino. Jesus lhe confirma: “Ainda hoje estarás comigo no paraíso” (cf. Lc 23,42-43). O centurião romano, chefe do pelotão de execução de Jesus e pagão, exclama: “Realmente, este homem era justo!” E as multidões, que tinham acorrido para a cena da crucificação, voltam para casa confusas e arrependidas, batendo no peito (cf. Lc 23,47-48). O bom Jesus, de tantas palavras bonitas, milagres e gestos divinos, havia sido esmagado pela onda poderosa das narrativas falsas!

Mas algumas pessoas não se deixaram convencer pela maldade das acusações falsas. Entre elas, Maria, sua mãe, algumas mulheres do grupo dos discípulos e João evangelista. Também José de Arimateia, doutor da Lei e membro do Sinédrio, homem justo, não se importa com o que possam pensar e dizer dele e vai a Pilatos, pedindo o corpo de Jesus, para lhe prestar as honras fúnebres. E Deus, que vê tudo com clareza e julga com justiça, está do lado de Jesus. Sua ressurreição gloriosa é a resposta inquestionável a todas as narrativas falsas inventadas contra Ele. Deus estava do lado de Jesus!

E quem hoje é vítima de fake news tenha a certeza de que há um Juiz justo, que não abandona o inocente acusado. A mentira tem vida curta e a verdade, afinal, triunfa.

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